Ciclo de Conferências
Religiões Africanas, em África e na Diáspora
A “religião dos orisha”: acertos e desacertos de uma globalização religiosa
Stefania Capone
Centre d’Études en Sciences Sociales du Religieux (CéSOR, EHESS)
21 MAIO . 18h00 . Auditório 0NE01 . ISCTE-IUL
Nas ultimas décadas, o panorama religioso afro-americano tem se modificado consideravelmente, devido sobretudo aos processos de transnacionalização religiosa que, em alguns contextos, datam dos anos 1960 e 1970. A difusão das religiões afro-americanas fora dos grupos sociais e dos territórios nacionais de emergência, a partir da segunda metade do século XX, constitui sem dúvidas uma das maiores transformações do campo das religiões afro-americanas. Essa difusão tem sido a consequência das idas e vindas dos adeptos e dos fluxos migratórios para outros países das Américas ou da Europa, sendo também alimentada pela criação de novos espaços públicos na internet e pela patrimonialização destas práticas a través da ação da UNESCO e dos Estados nacionais.
Hoje, a prática das religiões afro-americanas ultrapassa a área estritamente “afro-americana” para abranger pelo menos três continentes: as Américas, a África e a Europa. Esta difusão nos lembra outro espaço de circulação que está na origem da criação das religioes afro-americanas, ou seja o espaço do comércio triangular que marcou o nascimento do “Mundo Atlântico”, uma noção central na historiografia e na antropologia contemporâneas da qual procedem outras metáforas potentes, como o “Black Atlantic”, o Atlântico negro, um espaço de interacção e de interconhecimento que tornou possível a formação das culturas e das religiões afro-americanas.
O objetivo dessa reflexão não será apenas de evidenciar as novas configurações das religiões afro-americanas “na diáspora”, mas também seus desafios e seus pontos de tensão numa confrontação completamente inédita entre várias tradições regionais. Nos veremos que, desde os anos 1980, as religiões afro-americanas aspiram a uma unificação das práticas religiosas que visa a evidenciar a existência de uma suposta base comum a todas as modalidades de origem africana da “diáspora” americana. Estas tentativas engendram novas formas de “crioulização” religiosa, nas quais o trabalho sincrético, que funda historicamente este tipo de religiões, muda de signo, privilegiando as variantes endógenas (africanas ou afro-americanas) contra as influencias exógenas (européias ou católicas). Os emprestamos rituais, na religião lucumí dos Cubanos de Miami, de praticas originarias do candomblé brasileiro, assim que a reintrodução do culto de Ifá segundo a tradição cubana no candomblé, constituem casos exemplares da tensão fundadora entre unificação e fragmentação nestes fenômenos religiosos.
[Inserido no programa das Conferências Doutorais da ESPP]