Sociedade civil e contestação em Moçambique

P26 – Sociedade civil e contestação em Moçambique

Tanja Kleibl . Dublin City University
Kajsa Johansson . Universidade de Linnaeus

 

O foco do painel será a análise crítica do interface entre actores da sociedade civil moderna, em particular ONGs, e estruturas tradicionais sociais, tendo em conta a actual tensão política em Moçambique. Neste contexto o painel vai dar particular atenção a organização e mobilização popular que tem surgido como uma resposta às pressões dos grandes investimentos de agricultura exploração de recursos naturais em grande escala em Moçambique (deste tempo colonial até hoje), tendo em conta a problemática de instrumentalização política das ONGs . Para além de analisar novos movimentos e tipos de articulação pública, o painel vai discutir as tensões dentro do movimento/dos movimentos, entre a base e o topo, incluindo o papel que as ONGIs jogam e o poder que elas têm sobre as organizações nacionais e locais. Assim, o painel sugere a apresentação de análises situacionais concretas ligadas a casos de contestação, mobilização e/ou autodefesa (individual ou colectiva) contra usurpação de terras e, mais em geral, estratégias de desenvolvimento enquadradas no modelo dominante de desenvolvimento, ou seja “crescimento económico”. Um dos casos mais distintos, que pode servir como um do(s) estudo(s) de caso, é em relação ao Programa ProSavana (investimento Brasileiro e Japonês). Em geral, perguntas chaves que devem orientar as apresentações de casos concretos, como também o debate do painel, são as seguintes:

  • O modelo ocidental da sociedade civil liberal com o seu actor principal da ONG marginaliza estruturas tradicionais sociais e como consequência, reduz o potencial para o desenvolvimento independente e modernização local em Moçambique?
  • As ONGs de desenvolvimento têm alterado a sua perspectiva na última década – de empoderamento para apoio ao modelo dominante de crescimento económico? Qual é a implicação deste processo para o desenvolvimento de uma sociedade civil moçambicana mais profunda?
  • Estratégias ligadas a assistência de desenvolvimento reproduzem estruturas dominantes de poder? Quais são as opções para acções alternativas tendo em conta a situação da sociedade civil, a actual tensão político-militar como também o sistema socioeconómico e politico implantado e formado nas últimas décadas no pais?

Papers

A constituição da República de Moçambique e a legislação específica garantem aos moçambicanos liberdades várias, nomeadamente a liberdade de associação,manifestação, expressão, imprensa e o direito à informação. A criação de associações é encorajada, mas ao mesmo tempo suas ações não parece serem tão livres como consagra a lei. O Estado conserva o direito ao controle, limitação e repressão de movimentos populares que, supostamente, coloquem em causa a “segurança do Estado”, a “ordem” e a “tranquilidade públicas”. Esta comunicação olha para a configuração, ações e composição dos movimentos sociais e da sociedade civil moçambicana e conclui que, embora nos últimos tempos se tenha verificado um relativo fortalecimento, a fragilidade que caracteriza a sociedade civil moçambicana continua evidente – devido também ao próprio contexto social, político e económico vigente em Moçambique. Por outro lado, a capacidade da sociedade civil moçambicana ocupar o espaço público e promover a cidadania é deveras reduzida.

Boaventura Monjane

O artigo pretende situar criticamente impactos do ProSAVANA em relação à usurpação de terras dos camponeses moçambicanos. Enquadra-se no debate: “Sociedade civil e contestação em Moçambique”. Pois o Programa insere-se nos marcos da estratégia (neo)desenvolvimentista brasileira – cuja voracidade por terra demonstra resultados dramáticos (SANTOS, 2013) –, podendo ser caracterizada de natureza subimperialista e neocolonial. Baseado na pesquisa de iniciação científica incoada em 2016, junto ao projeto do Profº Dr. Marco Mondaini, ao Departamento de Serviço Social da Universidade Federal de Pernambuco (DSS-UFPE) e Instituto de Estudos da África. Propomos análise teórico-conceitual e histórico-social de abordagem marxista, centrada na categoria totalidade e nos conceitos de direitos humanos e (neo)desenvolvimentismo. O ProSAVANA, inspirado no PRODECER, foi instituído no cenário econômico nacional dependente e extrativista,  apresentando viés ”salvacionista”, de suposto promotor do desenvolvimento agrícola no Corredor de Nacala. Em oposição, organizações da sociedade civil, notadamente a UNAC, denunciam arbitrariedade na imposição do ProSAVANA, ausência de responsabilização pelas terras usurpadas e falta de transparência do processo. Percebe-se nesta conjuntura, os interesses da população em cujas terras será executado o ProSAVANA desconsiderados. Isto se deve ao fato de que o programa tem origem como projeto comercial, político e diplomático, sem real preocupação com a necessidade dos habitantes das zonas rurais, onde mais de 80% dos moçambicanos desenvolvem a agricultura familiar (World Bank, 2012). Assim, como pesquisadoras dos direitos humanos, é necessária reflexão acerca da tensão entre os direitos ao desenvolvimento e à autodeterminação dos povos (SANTOS, 2013).

 

Ana Caroline N. Nascimento . Universidade Federal de Pernambuco . carolineneves.proatec@gmail.com
Luana A. Coelho . Universidade Federal de Pernambuco . luana.andrade.coelho@gmail.com

For too long the discourse on civil society has been dominated by a Western conception based on classical liberal perceptions. We propose instead a social movement optic which foregrounds the struggle for social transformation. This paper focuses on the dynamics of rural social movements concerned with the re-appropriation of land ownership and livelihood strategies and their interface with Western-type NGOs in Mozambique. In order to decolonize and produce new knowledge about current of civil society dynamics grounded theory has been applied. We contest the North-centric discourse adopted by Western type NGOs (national and international) and show how these organizations actions can exclude much of the grassroots social interaction deemed ‘anti-development‘ or ’uncivil’ and thus not part of duly recognized civil society. Using the example of civil society involvement in the government (Brazil, Japan, Mozambique) supported Agri-Business Project ProSavana a brief overview of alternative actors at district, provincial, national and international level, as well as new spiritual-religious movements, is provided. Contextual influences of land ownership and new ties of solidarity on civil society development and on citizens openness to opt for strategies of resistance rather than dialogue and consensus-building are explained. The exclusion of many local actors, in particular religious and spiritual actors, in mainstream modernization and civil society theory, goes against some of the locally rooted civil society conceptions we identified. We propose a new conceptual framing of civil society generated from the experiences of African countries which differs from the mainstream Western liberal theory of civil society and focuses on social movement formation and actions.
Tanja Kleibl . Dublin City University
Jeremias Vunjanhe . ADECRU

The recent (18/3/16) feminist rally in Maputo, Mozambique to protest against the governmental order that obliges all girls to wear maxi-skirts as the critical measure against sexual harassment in schools, shows how problematic women struggles are, in Africa. The African cultural authenticity argument is foregrounding of an expressive male majority that favours maxi-skirts so to, allegedly, put girls and their mothers into place. On the contrary, the Mozambican feminist and women organisations and intellectuals argue that this is an excuse towards a progressive limitation of women’s human rights in the country and a strong setback in the ideals of independence. The developments, such as the arrest of several activists, the order to extradite a foreign feminist who was present in the rally and the rudeness of the debate in the social media, need attention and a critical exploration to understand what might be at stake. Pursuing an exercise of decolonising feminisms this work aims to reveal some of the abyssal lines (Santos, 2014) and its colonial effect that de-locates the narratives about emancipation and constraints feminist activism to unveil the continuum between colonialism, capitalism and the women’s oppression in Mozambique. This presentation is three folded. In a first moment, we briefly outline the current social and political aspects underlying the pervasive impoverishment, vulnerability and fear of the majority of the population, in particular women and girls. The second part is dedicated to the time and in the course weeks following the arrest and deportation of feminist activists. Finally we analyse and draw the contributions that this work brings to an African situated decolonising feminist perspective.

 

Teresa Cunha . Centre for Social Studies, university of Coimbra . teresacunha@ces.uc.pt
Terezinha da Silva . Women and Law in Souther Africa – Moçambique . terezinhanoddy@gmail.com

O texto emerge da feitura do trabalho de conclusão de curso (TCC) do Bacharelado Interdisciplinar em Humanidades – BHU, na Universidade da Integração Internacional da Lusofonia Afro-Brasileira (UNILAB), situada no Estado do Ceará, Nordeste do Brasil. Metodologicamente efetuou-se uma investigação interdisciplinar em humanidades sobre Mutilação Genital Feminina – MGF como uma prática que viola os direitos humanos das mulheres de Guiné-Bissau.  Analisou-se fontes escritas e orais, sobre a MGF, conhecido no crioulo da Guiné de “fanado de mindjer”, gênero, corpo e história. Especificamente, focou-se na luta dos ativistas para eliminar a prática da Mutilação Genital Feminina na Guiné-Bissau, evidenciando-se as consequências e/ou os riscos físicos/psíquicos de saúde que a MGF pode causar à vida das mulheres, entre eles, a possibilidade de transmissão da SIDA/AIDS, e ainda, destacando-se que o governo, atendendo as reivindicações dos movimentos sociais organizados, aprovou a Lei 14/2011, tipificando a MGF como crime punível com prisão. Em Guiné-Bissau, podemos dizer que o “saber local” (GEERTZ, 1997) encontra-se “amarrado a teias de significados” (GEERTZ, 1973, p.15) de um determinado território, povo, língua, cultura, apresentando “técnicas corporais” (MAUSS, 1974) diversas ao saber/fazer ocidental, cristão e cientificista. Para tanto, mergulhou-se nas contradições internas/externas dos ritos, histórias e das práticas tradicionais dos povos que praticam a MGF. Por fim, evidenciou-se nas fontes problematizadas a necessidade de mediações educativas que possibilitem sensibilizações de luta e resistência contra essa prática que prejudica a saúde das mulheres.

 

Roberto Kennedy Gomes Franco . Universidade da Integração Internacional da Lusofonia Afro-Brasileira – UNILAB . robertokennedy@unilab.edu.br

Elísio Júlio Fernandes

In my paper I will attempt to unpack local political trajectories and power dynamics that civil society actors and grass-root activists find themselves when they engage and respond to the presence of extractive industry (Liquefied Natural Gas project) in the province of Cabo Delgado, Mozambique. The paper will contextualise and historicise local actors, attempting to indicate what shapes them as active agents in relation to international capital in a postcolonial setting. I will attempt to map out other actors, relevant for understanding local power dynamics – international NGOs, local and traditional authorities, state authorities and international capital companies. Such mapping of power dynamics, inspired by James Ferguson criticism of commonly used verticality of “state – civil society” opposition, will allow to better understand possibilities and constraints of everyday citizenship practice and shed light on existing modes of governmentality, which are significantly connected to transnational networks. The paper will become a basis for my master thesis, which, I hope, will be further supplemented with data collected during field study in Northern Mozambique.

 

Jevgenija Kovaliova . Centre of African Studies, University of Copenhagen . ekovaliova@yahoo.co.uk

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